terça-feira, 21 de janeiro de 2020

Uma crítica ao formato da televisão brasileira - Um Dia na Vida de Eduardo Coutinho

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Lembrando a morte do grande cineasta Eduardo Coutinho, um dos melhores documentaristas do cinema mundial, quero destacar a sua última realização artística. Observando a sua carreira, não é difícil perceber que Coutinho sempre procurou retratar pessoas comuns de uma forma sempre íntima e objetiva, colocando em evidência as idiossincrasias de cada indivíduo. Diferentemente do que vemos na televisão, que possui uma linguagem precária, o cinema de Coutinho faz de indivíduos, histórias interessantes e situações tristes, uma forma de reconhecermos pessoas singulares. Neste filme, o seu cinema encontra o ápice crítico – na verdade não sei se podemos chamar de filme. O longa-metragem mostra um resumo da programação da televisão brasileira, em 90 minutos, de manhã até a noite. Assim, observar as limitações, os problemas e a ideologia central na tevê brasileira é o foco principal.

Desde o período da manhã, comerciais sobre brinquedos são passados junto com desenhos, em um incentivo aos pequenos espectadores infantis para consumirem cada vez mais, tornando a lógica do consumismo uma inculcação que começa desde cedo. Logo depois, programas sobre culinária e estética são mostrados com o intuito de criarem um padrão da beleza determinado pelos programas - curioso notar que todas as pessoas, depois da transformação, se assemelham à apresentadora do programa.

No período da tarde este aspecto será repetido, com inserções sobre pessoas que mudam de rosto, fazem lipoaspiração, e compram produtos para entrarem em forma, mostrando a covardia que a televisão cria nos desejos dos seus espectadores – um ciclo de consumo sem fim. Mas, o pior está nos telejornais. Desde o jornal da Band, até o Jornal das 20h na Rede Globo, o telejornalismo brasileiro é um insulto, uma verdadeira ode à violência. Cenas de violência, comentários ignorantes por parte dos apresentadores – em um momento, o apresentador diz que mulher deve ser segurada à força, ao invés de bater nela -, ressaltam que as reportagens não possuem qualidade nenhuma e valores como o sexismo e a violência em si mesma se colocam como paradigmas centrais, e são reforçados cada vez mais no pobre universo jornalístico das meras aparências.

A televisão é a síndrome de uma sociedade que possui valores conservadores, os reproduz, reforçando como se fosse um serviço social obrigatório a todos que vivem nela. Lembrando assim que, na verdade, o que a televisão faz é um desserviço à sociedade e que, portanto, deveria ser radicalmente transformada com a conscientização crescente das pessoas. Depois disso, Coutinho e outros grandes cineastas serão reconhecidos e grandes histórias vão superar a barbárie que é mostrada na televisão brasileira, dia a dia.

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Texto escrito em 2014.
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Mais informações em:
https://filmow.com/um-dia-na-vida-t60582/

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